sexta-feira, 24 de abril de 2020


22. Tchaikovsky: concerto p/ piano nº 1, concerto p/ violino |

Os concertos para piano nº 1 e para violino de Tchaikovsky, e o semelhante destino que o divino escreveu numa espécie de Código Morse: critica - negação - maravilhamento - aceitação - estreia_americana - sucesso - maravilhamento - arrependimento - defesa_russa - fama_mundial.






Para o meu amigo Rui Reis, o amigo do peito mais antigo, que está sempre comigo, e para o seu afilhado que faz hoje 14 anos: o meu filhote André!

(E à memória do fabuloso concerto pela Orquestra Gulbenkian, que fomos assistir à Casa da Música em 26-05-2007, onde estavam também Tchaikovsky, Lang Lang, Foster... e um salto da cadeira aos primeiros compassos!)

(PS: as vezes que o André viu a Melanie Laurent imitar que tocava este "Concerto" para violino! A tender para o infinito...)






É reconhecido pela história, que o mundialmente famoso compositor Pyotr Il'yich Tchaikovsky (1840-1893), só veria justificado esse adjectivo a partir de 1875 e do seu concerto para piano nº 1.
Na realidade, Pyotr iria compor o seu 1º concerto para piano em 1874, de longe o mais famoso das 3 obras que escreveu neste género, aproveitando a tradição musical da Europa ocidental de Mozart, Beethoven e Schubert (...que dominava), mas ligando-a simultaneamente às tradições da sua Rússia natal (...que amava), o que tornaria o seu concerto uma obra incontornável do reportório para piano (porventura um excelente Case Study da relação: Controlo da Técnica versus Descontrolo da Paixão), e seguramente uma daquelas que poderia ser colocada na arca dos exemplos que nos define, em viagem cósmica pela sonda Voyager.
Tchaikovky trabalhará no concerto durante os meses de Novembro e Dezembro, terminando a versão para 2 pianos no dia 21 de Dezembro. Para além da majestosa introdução (...e um salto na cadeira), o 1º andamento apresentaria um tema inspirado na canção popular ucraniana, "Oy ishov kozak z Donu" (Aqui vem um cossaco de Don), como escreveria o compositor à sua amiga e patrona, Nadezhda von Meck, contando-lhe que a teria ouvido cantar por pedintes na cidade ucraniana de Kamenka, onde teria passado os meses de verão na casa da sua irmã Sasha (um veraneio inclusivamente proveitoso, no exercício da "Procura do Belo" para a música, portanto). Já o 2º andamento conteria uma melodia da canção francesa "Il faut s'amuser, dancer et rire", que segundo o seu irmão Modest seria cantada com frequência na família Tchaikovsky, enquanto que o 3º andamento mostraria uma melodia popular também ucraniana, "Viydi, viydi, Ivan'ku" (Vai para fora, Ivan'ka), que Alexander Rubets teria publicado na sua colectânea de música popular Sbornik Ukrainskikh Narodnikh Pesen, em 1872.
Na véspera de Natal de 1874, Tchaikovsky tocará o seu concerto a Nicolay Rubinstein, um amigo que tinha estreado as suas primeiras sinfonias e o seu Romeu e Julieta, e o pianista virtuoso mais estimado na Rússia, a quem Pyotr teria pensado dedicar a obra e no qual tinha esperanças que viesse a fazer a estreia (aparentemente não descabidas face à prévia dedicatória). Ao que parece, Rubinstein terá ficado em silêncio durante toda a apresentação (...o que é de louvar)... mas já o que terá afirmado após a longa (... e certamente angustiante) pausa no final, seria decepcionante para o autor, tendo sido proferidas criticas sobre a vulgaridade da peça, que também, ao que parecia, seria impossível de tocar.
Ás alterações que Rubinstein lhe terá pedido que realizasse, Tchaikovsky responderá com zero modificações, conclusão da partitura a 21 de Fevereiro de 1875 e a estreia em Boston, a 25 de Outubro do mesmo ano, com um Amigo Hans von Bulow ao piano (esse sim merecedor da dedicatória final, ficando conhecido o que terá escrito a Pyotr sobre o concerto, a 1 de Junho: "...é uma verdadeira joia e você merece a gratidão de todos os pianistas", palavras para quê...), o maestro Benjamin Johnson Lang e um estrondoso sucesso que perdura até hoje.
Após a estreia em Boston, seguir-se-iam várias reproduções um pouco por toda a parte, sendo conhecida a de São Petersburgo a 13 de Novembro, onde Tchaikovsky veria a interpretação pública do seu concerto pela 1ª vez, em Nova Iorque a 21 desse mês, e em Moscovo a 3 de Dezembro, com o pianista Sergei Taneyev (...aluno de composição de Tchaikovsky no Conservatório de Moscovo) e a direcção de... Nicolay Rubinstein, que reconheceria o erro do seu veredicto apressado (... porventura a compreensível pressa que teria para a celebração da consoada Russa, pudesse ter sido um condicionante importante... um exemplo de péssimo timing opinativo, eventualmente), e que viria a defendê-lo e a interpretá-lo inúmeras vezes com grande êxito, nomeadamente na Exposição de Paris de 1878 (...pelo que terá sido perdoado, pelo menos por mim).


É sabido de forma comum, que o violino não seria um instrumento propriamente popular entre os compositores russos do séc. XIX, não existindo, por exemplo, um concerto para violino na lista das obras escritas por Glinka, Mussorgsky ou Rimsky-Korsakov, que teriam uma predilecção pelo piano.
Só em 1878 encontraríamos um concerto russo para violino, neste caso o de Pyotr Il'yich Tchaikovsky, o único que escreveu para este instrumento e que continua a ser, até hoje, um dos mais populares e executados do reportório.
As constantes preocupações financeiras e o fracasso do seu casamento com Antonina Miliukova (supostamente merecedor da tentativa de suicídio que lhe sucedeu), fariam sentir em Pyotr a necessidade de se retirar da vida pública, pelo que, aconselhado pelo seu médico, decide ir a banhos para a Suíça (...eventuais desejos de neutralidade e paz), onde se viria a instalar na casa do seu irmão Anatoly, na localidade de Clarens no lago Genebra, em Março de 1878, na esperança de que aquela estadia o ajudasse a reencontrar o caminho para a composição, o que supostamente sucederia, uma vez que, para além do seu concerto para violino, iria também avançar na sua ópera Eugene Onegin e na sua 4ª sinfonia, o que indiciaria a excelência daquelas águas, para além do famoso e simultaneamente excitante chocolate local.
Na realidade, Tchaikovksy escreveria o concerto no espaço de um mês (finalizaria a orquestração a 29 de Abril), centrando toda a música à volta do solista, o que lhe conferiria uma notável aceitação pelo seu lirismo e utilização de temas populares. A parte solística de beleza voluptuosa e alegre excitação (...chocolate?), seria assistida pelo jovem violinista Joseph Kotek (...aparentemente, não...), aluno do famoso virtuoso Joseph Joachim e amigo de Nadezhda von Meck (sua patrona e confidente, à qual iria escrever desde o lago Genebra: "O primeiro andamento já está acabado, amanhã começo o segundo. A minha favorável disposição persiste e nesta atmosfera a composição perde todo o carácter de trabalho, passando a ser uma bênção continua."), mas que apesar disso, aceita ainda o conselho do irmão Modest, e substitui o movimento lento (que reaparecerá na sua "Méditation", op. 42) pela melancólica canzonetta, que rascunha em apenas um dia.
Tchaikovsky teria escrito o concerto com a ideia de o dedicar a Leopold Auer, famoso violinista e professor húngaro, o qual gostaria de ver estrear a obra. No entanto Auer declinaria o convite, com a justificação da extrema dificuldade e ausência das características violinísticas necessárias à interpretação (...Autor 0 : Dedicatário 2), e o concerto estrear-se-á em Nova Iorque a 4 de Dezembro de 1879, por Adolph Brodsky (que o adora) e o maestro Hans Richter (...Rússia 0 : América 2), sem o sucesso inicial eventualmente desejado pelo compositor, ao que não ajudaria as palavras que seriam proferidas pelo vienense Eduard Hanslick, dois anos depois: "O concerto para violino de Tchaikovsky dá-nos pela primeira vez a hedionda noção de que pode haver música que cheira mal aos ouvidos." (às quais acrescento: lamentáveis afirmações que um fundamentalismo Brahmsiano provocaria em mentes mais opacas).
A obra recuperará dessa critica devastadora e rapidamente alcançaria um sucesso triunfante um pouco por todo o mundo, pelas mesmas razões que Hanslick a teria criticado: "vigor tremendo, romantismo retórico, e um final arrebatador que mistura uma dança cossaca enérgica com uma atmosfera eslava rústica". Coisas da vida de um critico.
Quanto a Auer... viria mais tarde a mudar de ideias, a arrepender-se e a tornar-se num dos seus mais fervorosos defensores... Déjà vu?!

Nuno Oliveira





 "Concerto p/ piano nº 1, em si b menor, op. 23"
 "Concerto p/ violino, em ré maior, op. 35"


Extractos que proponho para audição: (conc. p/ piano) (ver também publicações nº 4, 51 e 74)
  • Mikhail Pletnev
  • The Philharmonia
  • Vladimir Fedoseyev
  • Virgin, VC 7 91190-2
"o belo": todo o concerto (Sonoridade romântica exuberante e pianismo a alta
                rotação num registo intemporal e obrigatório. Um dos ícones d"o belo"
                a não perder.)
                I: (Queira entrar sua majestade... o Piano!) [youtube]
                II: (...pastoral da alma...) [youtube]
                III: (...o orgulho Russo... na beleza Russa.) [youtube]






  • Yefim Bronfman
  • Symphonieorchester des Bayerischen Rundfunks
  • Mariss Jansons
  • Sony, 82876777182
"o belo": (Ao vivo... e com a maravilhosa intuição de Mariss Jansons.), I [youtube],
                   II [youtube], III [youtube] (Nota: recomendo também a sinf. nº 4)






  • Andrei Gavrilov
  • Philharmonia Orchestra
  • Riccardo Muti
  • EMI, CDM 7 64329 2
"o belo": (As paixões de um jovem da década de 70.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]






  • Lang Lang
  • Chicago Symphony Orchestra
  • Daniel Barenboim
  • Deutsche Grammophon, B0000666-02 GH
"o belo": (As paixões de um jovem do séc. XXI.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]






  • Mikhaïl Rudy
  • Leningrad Philharmonic Orchestra
  • Mariss Jansons
  • EMI, CDC 7 54232 2
"o belo": (Lirismo e sensibilidade a não perder.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]






  • Nikolai Demidenko
  • BBC Symphony Orchestra
  • Alexander Lazarev
  • Hyperion, CDA66680
"o belo": (Um outro lado para descobrir...), Extractos [allmusic]






  • Boris Berezovsky
  • Ural Philharmonic Orchestra
  • Dmitri Liss
  • Warner, 2564 63074-2
"o belo": (uma interpretação diferente do habitual, que privilegia a introspecção ao
                heroísmo. Não se deixem enganar pelo início inseguro, existe aqui poesia na
                contemplação e ímpeto na suave intensão), I [youtube], II [youtube], III [youtube]






  
Outras sugestões:
  • Peter Donohoe/Rudolph Barshai/Bournemouth Symphony Orchestra/EMI, CDC 7 49939 2 (A versão clássica da integral de Donohoe.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]




  • Barry Douglas/Leonard Slatkin/London Symphony Orchestra/RCA, RD89968 (A visão de um vencedor do Concurso Tchaikovsky.), Completa [youtube]




  • Andrei Gavrilov/Vladimir Ashkenazy/Berliner Philharmoniker/EMI, CDC 7 49632 2 (Som puro e visão cristalina pelo jovem Andrei uma década depois.), I-III [youtube]




  • Vladimir Feltsman/Mstislav Rostropovich/National Symphony Orchestra/Sony, SMK 45756 (O entendimento da alma Russa por dois nativos.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]




  • Elisabeth Leonskaja/Kurt Masur/New York Philharmonic/Teldec, 3984-23727-2 (Solenidade ao vivo para descobrir.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]






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Extractos que proponho para audição: (conc. p/ violino) (ver também publicações nº 4, 51 e 74)
  • Maxim Vengerov
  • Berliner Philharmoniker
  • Claudio Abbado
  • Teldec, 4509-90881-2
"o belo": todo o concerto (...a inspiração de Vengerov e a nova vida deste concerto!)               
                I: (Quando "o belo" é Vengerov...) [youtube]
                II: (...uma vez mais: Vengerov...) [youtube]
                III: (...Vengerov para sempre? É possível que sim!) [youtube]






  • Itzhak Perlman
  • The Philadelphia Orchestra
  • Eugene Ormandy
  • EMI, CMS 7 64922 2
"o belo": (A visão do virtuoso supremo do nosso tempo.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]





  
  • Joshua Bell
  • The Cleveland Orchestra
  • Vladimir Ashkenazy
  • Decca, 421 716-2 DH
"o belo": (A expressividade do novo mundo em Bell.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]





  
  • Julian Rachlin
  • Moscow Radio Symphony Orchestra
  • Vladimir Fedoseyev
  • Sony, SK 66567
"o belo": (O brilho e a beleza mostrados ao vivo.), I-III [allmusic]






  • Dmitry Sitkovetsky
  • Academy of St. Martin in the Fields
  • Neville Marriner
  • Hänssler, CD 98.346
"o belo": (O virtuosismo irrepreensível e sonoridade cristalina de Sitkovetsky.)
                  I [youtube], II [youtube], III [youtube]






  • Kyung Wha Chung
  • Orchestre Symphonique de Montréal
  • Charles Dutoit
  • Decca, 410 011-2 DH
"o belo": (O eterno feminino de Chung.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]








  • Itzhak Perlman
  • Israel Philharmonic Orchestra
  • Zubin Mehta
  • EMI, CDC 7 54108 2
"o belo": (Registado ao vivo numa ocasião histórica. Som atmosférico, onde se nota
                o ruído de fundo, mas que logo é esquecido quando começamos a sentir a
                emoção e sensibilidade que transparece do violino sobrenatural de Itzhak
                Perlman.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]







Outras sugestões:
  • Sarah Chang/Colin Davis/London Symphony Orchestra/EMI, CDC 7 54753 2 (O milagre que é Chang.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]




  • Nigel Kennedy/Okko Kamu/London Philharmonic Orchestra/EMI, CDC 7476232 (A irreverência de Kennedy.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]




  • Pinchas Zukerman/Zubin Mehta/Israel Philharmonic Orchestra/CBS, MK 39563 2 (A jovialidade de Zukerman.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]




  • Vanessa-Mae/Kees Bakels/London Symphony Orchestra/Trittico, TCMA 27103 (O atrevimento de uma menina de treze anos que não envergonha ninguém.), I [youtube], II [youtube], III [youtube]






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P. I. Tchaikovsky (à dir.) com os irmãos Anatoly e Modest (em pé) e Nikolay Kondratyev [1875]



P. I. Tchaikovsky (à dir.) com Joseph Kotek [1877]





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Badabadaba...♫

 

...badabadaba ⛱






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O Concerto e o André [Nelas, 2011]




Um concerto do André [Seia, Orquestra do Conservatório de Música de Seia, 08-07-2016]



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