51. Tchaikovsky: sinfonia nº 5 |
A 5ª de Tchaikovsky: directa ao coração de Nadezhda e fatal como o destino de Modest... "cunhada" nas duas faces da moeda de Pyotr Ilyich.
Para a Xana...
Pressiono o Play e logo começo a perceber que, ao longo da vida, poucas terão sido as conversas à volta de sumptuosidade melódica e mensagem emotiva, que não tenham acabado obrigatoriamente em Pyotr Ilyich Tchaikovsky (1840-1893). Com efeito, se admitirmos que o impacto de um ser humano sobre outro pode ser quantificado através da velocidade de um pensamento deste último sobre o primeiro, então seremos capazes de imaginar a dimensão de um pensamento que surge de forma automática, e, desta forma, avaliar a importância que Tchaikovsky terá sobre muitos de nós. Ora, se os científicos "anos luz por nano-segundo" ficam aquém do filosófico "automático", uma possível conclusão será...: "- Sim, eu sei... os excessos do romantismo fazem-me muitas vezes exagerar".
"Sinfonia nº 5, em mi menor, op. 64"
✨ Extractos que proponho para audição: (nota: ver também publicações nº 4, 22 e 74)
... com muitos beijiiiiiiiiiiiiiiiiiiiinhos da malta cá de casa, que gosta muito de ti.
É bem provável que esta obra seja a que mais vezes assisti ao vivo, interpretada por várias orquestras nacionais e estrangeiras, e, no entanto, chega a ser curioso como a apresentação que mais me tenha marcado até hoje continue a ser a primeira, um concerto no TAGV, em Coimbra, numa noite inesquecível de Julho de 1998, com a Orquestra Nacional do Porto e o maestro (o enorme!) Michael Zilm. Tu estavas lá connosco, e o brilho que tinhas nos olhos após o final do concerto (de quem descobre um mundo novo...), fariam já imaginar que por aquela altura, longe dali, em Salzburgo, se ouvia uma outra 5ª... impossível de igualar.
Pressiono o Play e logo começo a perceber que, ao longo da vida, poucas terão sido as conversas à volta de sumptuosidade melódica e mensagem emotiva, que não tenham acabado obrigatoriamente em Pyotr Ilyich Tchaikovsky (1840-1893). Com efeito, se admitirmos que o impacto de um ser humano sobre outro pode ser quantificado através da velocidade de um pensamento deste último sobre o primeiro, então seremos capazes de imaginar a dimensão de um pensamento que surge de forma automática, e, desta forma, avaliar a importância que Tchaikovsky terá sobre muitos de nós. Ora, se os científicos "anos luz por nano-segundo" ficam aquém do filosófico "automático", uma possível conclusão será...: "- Sim, eu sei... os excessos do romantismo fazem-me muitas vezes exagerar".
Por outro lado, para além de índices de velocidade, poderíamos explorar também níveis de frequência, uma aproximação de igual modo possível, e a ter em conta numa próxima oportunidade Tchaikovskyana.
Se atendêssemos exclusivamente à fama que as sinfonias de Tchaikovsky possuem nos nossos dias, ficaríamos com uma percepção muito distante da realidade vivida por aquele compositor. Em boa verdade, apesar do seu reconhecimento internacional, fruto da boa aceitação das suas obras para voz e da sua música de câmara, a falta de aceitação, e consequente fracasso, das suas quatro primeiras tentativas sinfónicas, culminadas na (hoje) aclamada quarta sinfonia de 1878, faria com que o compositor abandonasse esse género musical durante uma década. Passar-se-iam, assim, dez anos de solidão (sinfónica, entenda-se), até à chegada de 1888, e, com ele, a criação da sua quinta sinfonia, o receptáculo aparente da compressão de noventa (valor que dá jeito à narrativa...) anos de solidão emocional (admissível, neste caso, ou não se tratasse de Tchaikovsky, de alguém convencido do seu declínio criativo logo a partir das primeiras linhas de música que escreveu...), que acrescentados aos temporais dez já existentes, formariam, desta forma, a banda sonora adequada para retratar possíveis "Cem anos de solidão" (de García Márquez ou de outros que tais), à condição de que durante o percurso, claro está, se constatassem a presença de personagens atormentadas e de vastos sentimentos de culpa, semelhantes aos encontrados na família "Buendía".
Durante o Inverno e os primeiros meses da Primavera de 1888, que precederam a composição desta obra, poderíamos encontrar o compositor em tournée por cidades como Leipzig, Hamburgo, Berlim, Londres, Paris ou Praga, ouvindo a sua música, dirigindo-a muitas vezes e travando conhecimento com algumas das principais figuras musicais da época, como seriam os exemplos de Brahms, Grieg ou Busoni. Por esta altura, teria já tido conhecimento, também, de que o Czar Alexandre III lhe teria garantido a independência financeira que a atribuição de uma pensão vitalícia de 3000 rublos assegurava, apesar das suas características depressivas não lhe permitirem a aguardada satisfação, como, aliás, viria a escrever ao seu irmão mais chegado, Modest: "A minha consciência preocupa-me porque penso que não o mereço".
Em Abril retornaria a casa, mais concretamente à sua casa de campo em Frolovskoye, situada a cem quilómetros a noroeste de Moscovo, recentemente adquirida apesar de supostas incertezas morais ou dúvidas éticas, evitáveis quando se autorreconhece o muito trabalho que dá ter o valor que alguém afirma testemunhar. Com efeito, a falta de autoestima e as dúvidas profissionais, hoje reconhecidamente infundadas, viriam a marcar de forma dolorosa a vida trágica de Pyotr, ao que os conflitos emocionais ligados ao secretismo da sua homossexualidade, retratada na sua correspondência por "Z" (a derradeira letra do alfabeto da vida, que o suicídio, mais tarde, viria dramaticamente confirmar), seguramente não iriam ajudar.
E seria neste ambiente agridoce, porventura mais doce que agre, que Tchaikovsky tomaria coragem e escreveria a sua Sinfonia nº 5, em mi menor, op. 64, entre Abril e Julho, uma obra-prima e a sua sinfonia mais popular num relâmpago de quatro meses, com a consciência porventura menos pesada e a convicção reflectida nas palavras que escreveria à sua maior amiga, e patrona que sempre o motivara, Nadezhda von Meck: "A sinfonia está pronta, parece-me que não falhei e que está boa". Neste caso, prevaleceria o optimismo surreal daquela amiga, tão diferente de si, em desfavor do pessimismo duma realidade espelhada naquele irmão, tão parecido consigo, tão escondido de si mesmo como também o era ele, de igual modo encerrado numa homossexualidade que não poderia ter lugar naquele tempo e tempo naquele lugar. Vinte anos depois da sua morte, quis o destino, irónico como sempre, aquilo que o grande empresário dos Ballets Russes, Sergei Diaghilev, escreveria a partir de Paris: "Tchaikovsky cometeu suicídio por medo da sua homossexualidade ser descoberta; contudo, hoje em dia, se fores um compositor e não fores homossexual é melhor que metas uma bala na cabeça". Dá vontade de rir apesar de só pensarmos em chorar.
A obra viria a ser estreada em S. Petersburgo, a 17 de Novembro desse ano, com a direcção do compositor, e apresentada em Praga logo depois. Apesar do público dessas duas cidades ter acolhido a música de forma calorosa, as opiniões frias que seriam emitidas pela irmandade costumeira de críticos, iriam, uma vez mais, afectar a frágil confiança do compositor, todavia, por pouco tempo, e apenas até às apresentações que se seguiriam em Moscovo, com semelhante calor pelo público e contrária apreciação pela imprensa, que neste caso se mostraria favorável, culminando na ovação sem precedentes que viria a ocorrer em Hamburgo, mesmo que para isso possa ter possivelmente contribuído a dedicatória a Theodor Avé-Lallemand, o presidente da Sociedade Filarmónica local, um dos seus inúmeros admiradores estrangeiros e aquele que o teria tentado persuadir a sair da Rússia para se instalar permanentemente na Alemanha. A reacção do público germânico seria o pronuncio do que viria a acontecer mais tarde: em apenas um ano, as suas melodias já eram assobiadas um pouco por toda a parte, conferindo deste modo à sua formula "simples" (a genialidade é isso mesmo) o sucesso que tantas vezes teria desejado (...mas que certamente julgaria não merecer).
De facto, Tchaikovsky viria a utilizar uma linguagem formal e facilmente compreensível, em que o fim de um andamento antecipa o inicio do andamento seguinte, apesar do tema principal, em tom menor e apelidado de "Destino", escutado em todos eles, não servir tanto como elemento unificador, mas, pelo contrário, como elemento disruptivo (...fatal, como só ele próprio), como alguém que não segue a corrente mas que se intromete sempre com as perguntas certas, desde o início pessimista do primeiro andamento ("A total submissão perante o Destino...", escrita pelo próprio numa nota programática introdutória, como era seu costume), passando pela nostalgia do segundo ("Deveria lançar-me no abraço da FÉ?", uma frase registada, também pelo autor, no esboço da obra) e a leveza do terceiro, até se chegar ao quarto andamento e à resposta final, de que, afinal, sempre haverá esperança enquanto se encarar o fado em tom maior. Eu, pelo menos, gosto de pensar assim.
Todo este conjunto de acontecimentos só poderia dar nisto: uma das obras do reportório sinfónico mais amadas por todos aqueles que ainda se atrevem a sonhar de olhos abertos, ouvidos atentos e imaginário ilimitável. Parece exagero? Poderia ser, mas neste caso não. É mesmo assim... experimentem e me dirão...
Nuno Oliveira
"Sinfonia nº 5, em mi menor, op. 64"
✨ Extractos que proponho para audição: (nota: ver também publicações nº 4, 22 e 74)
- Wiener Philharmoniker
- Valery Gergiev
- Philips, 462 905-2 PH
Filarmónica de Viena e Gergiev representavam o melhor que o mundo tinha
para oferecer. Imperdível!), com alguns destaques, identificados a seguir;
[I]: tutti, aos 0:00-2:51 (Suores frios e dores no peito... É necessária uma pausa
para respirar? "Sim, por favor!"- responderam maestro, músicos e público, aos
1:29-1:33); metais (preciosos vienenses!), aos 4:01-4:43, 6:55-7:18, 8:04-8:18,
8:51-9:13 e 12:54-13:18; cordas (e as valsas habituais daquelas paragens!),
aos 12:07-12-43 [youtube]
[II]: tutti e trompa, aos 0:00-2:13 (E Deus criou "o belo". Mítico!) [youtube]
[III]: tutti (A leveza e serenidade antes do grande final.) [youtube]
[IV]: tutti, aos 3:00-3:26 (Humores...); metais (nobres vienenses!), aos 5:22-5:43;
[II]: tutti e trompa, aos 0:00-2:13 (E Deus criou "o belo". Mítico!) [youtube]
[III]: tutti (A leveza e serenidade antes do grande final.) [youtube]
[IV]: tutti, aos 3:00-3:26 (Humores...); metais (nobres vienenses!), aos 5:22-5:43;
tutti, aos 8:51-... (Velocidades estratosféricas e...) e 9:22-12:00 (...a inesquecível
apoteose final!) [youtube]
- Oslo Philharmonic Orchestra
- Mariss Jansons
- Chandos, CHAN 8351
bravura a fazer lembrar os tempos de Leninegrado e o seu mestre Evgeny
- West-Eastern Divan Orchestra ou Chicago Symphony Orchestra
- Daniel Barenboim
- Warner, 2564 62190-5 ou Teldec, 20831-1548-2
inspiradoras. Barenboim como nos habituou, e os músicos de Chicago,
do Este e do Oeste, imaculados. Histórico e a não perder também.)
Warner: [I-IV] [allmusic]
Warner: [I-IV] [allmusic]
Teldec: [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]
✰ Outras sugestões:
- Simón Bolivar Youth Orchestra of Venezuela
- Gustavo Dudamel
- Deutsche Grammophon, 477 8022 GH
Surpreendentes estes jovens Venezuelanos? "Olhe que não... olhe que
não" (eles são já uma afirmação). Ao vivo e simplesmente electrizante.)
- Bournemouth Symphony Orchestra
- Andrew Litton
- Virgin, VC 7 91140-2
valsas delicadas e articulação perfeita. Uma escolha a ter em conta.)
[I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]
[I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]
- Wiener Philharmoniker
- Herbert von Karajan
- Deutsche Grammophon, 415 094-2 GH
apreciava esta música. Uma belíssima opção.)
[I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]
[I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]
- Riccardo Muti/Philharmonia Orchestra/EMI, CDC-7 47859 2 (A visão do maestro italiano que interessa escutar.), [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]
- Claudio Abbado/Chicago Symphony Orchestra/Sony, SK 42094 (O ensaio de 1985 em Chicago. A visão está lá. A tensão há-de vir depois, em Berlim.), [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]