terça-feira, 1 de novembro de 2022


75. Beethoven: sinfonia nº 5 |

A "Sinfonia nº 5" de Ludwig van Beethoven e a transição espiritual da humanidade ao encontro de um "Destino" Romântico de proporções cósmicas.






Em homenagem às 5 Bandas Filarmónicas que constituem a União de Bandas de Águeda; durante décadas sinónimas de:
Bravura sonora, Brilhantismo artístico, Beleza interpretativa, Bondade colectiva e Brio individual.
Tudo isso merece um grande Bravo, tudo isso merece uma enorme 5ª do gigante Beethoven.






"Tcham, tcham, tcham, tchaaaaam!".
Seria assim que naquele ano de 1808 Ludwig van Beethoven (1770 - 1827) daria a conhecer ao mundo a sua "Sinfonia nº 5, em dó menor", obra maior que teria começado a esboçar a partir de 1804 e que o imortalizaria na memória dos homens, tornando-se a sua imagem de marca mais popular, reconhecida em qualquer recanto do mundo (à partida...).
Na realidade, este famoso tema de quatro notas ferozes que dominaria o primeiro andamento e apareceria nos restantes três, seria aquele que viria a provocar pela primeira vez na obra do compositor uma sensação de coerência num desenvolvimento crescente até se alcançar o resultado final, fosse este conseguido através do contexto puramente musical, com a produção de diversidade melódica a partir daquela unidade temática simples, ou ligando-a eventualmente a alguma ideia de carácter mais poético ou mesmo filosófico. Por outras palavras, a defesa da razão que daria a tal sensação de unidade aos quatro andamentos e a consequente fama a esta sinfonia, dividir-se-ia entre os que se apoiariam nas relações internas da própria música e os que, por outro lado, entenderiam a existência de um programa poético por trás de tudo isto (na minha infância aprendi que a tabuada cantada tinha outra graça, pelo que provavelmente todos terão um pouco de razão se apostarmos num pensamento equilibrado).
Em todo o caso, podemos sempre contar com a declaração que o próprio compositor faria acerca do início violento desta sua quinta sinfonia: "E é assim que o destino bate à porta!". Ora, se dúvidas houvessem as mesmas tender-se-iam a dissipar com esta referência categórica, pelo que na mente do público esta obra viria a estar tendencialmente ligada a ideias não musicais, como seriam o conflito, o triunfo, a liberdade e a fraternidade, todas elas noções associadas a uma Revolução Francesa ocorrida à já quase duas décadas (admite-se que o nosso Ludwig van estaria à muito tempo obcecado com ideias de revolução e igualitarismo, existindo inclusive uma peça coral do estimado Cherubini escrita com um texto alusivo à Revolução Francesa, que anteciparia vivamente o famoso motivo que viria a servir de base a esta sinfonia). Para além disso, Anton Schindler, o secretário pessoal do compositor e o seu primeiro biógrafo, viria ainda a introduzir a ideia de uma "chave do destino", e, com base nisso, a apelidar esta obra de "Sinfonia do destino", definindo, a partir daí, as linhas de orientação para a sua interpretação romântica, com o drama a ocupar o lugar central no palco, que muitos ilustrariam como a chegada da luz da manhã depois de uma noite de trevas ou como a batalha até à vitória final.
Beethoven começaria então a escrever a sua quinta sinfonia logo após a conclusão da terceira ("Heroica"). Contudo, diversas razões, incluindo a necessidade de ganhar a vida com outras composições (recordo que o mestre seria um dos primeiros compositores independentes do seu tempo, sem um empregador ou uma remuneração regular), fariam com que Beethoven viesse a interromper o seu trabalho por várias ocasiões ("pausa" entre 1804 e 1806 para escrever o concerto para piano nº 4, a sinfonia nº 4 e o concerto para violino; "attacca" de novo em 1807 ao mesmo tempo que escreve a sua sinfonia nº 6, "Pastorale", concluída poucos meses depois desta quinta), sendo que a carta que o compositor enviaria ao Conde Franz von Oppersdorf, personalidade que lhe teria encomendado esta sinfonia, viria a confirmar que a mesma não teria sido concluída até à primavera de 1808, provando, deste modo, o extenso período de gestação da obra, com praticamente cinco anos passados desde o seu esboço inicial.
Por outro lado, apesar da obra já ter sido paga, o Conde viria ainda a receber uma mensagem do compositor em Novembro desse ano: "Querido Conde! Sei que vai ficar com pouca consideração por mim, mas fui obrigado a vender a sinfonia que tinha escrito para si... a outro". Este "nobre" desagrado não teria, porém, valido a pena, visto que as dificuldades económicas de Beethoven não ficariam resolvidas com o histórico concerto de beneficência da Academia Musical de Viena, realizado a 22 de Dezembro de 1808 no Theater an der Wien, onde para além da estreia desta sua quinta sinfonia, seriam também apresentados o seu concerto para piano nº 4, a cena e ária "Ah! Perfido", excertos da missa em dó maior, e as estreias da sinfonia nº 6, "Pastorale" e da Fantasia Coral! Com efeito, o concerto não teria tido a aceitação que o compositor desejaria, tendo um jornal da época inclusive escrito que: "Existe apenas uma palavra para descrever este concerto: insatisfatório".
Para além disso, embora esta sinfonia tivesse sido apresentada com sucesso várias vezes no ano seguinte, os inúmeros erros cometidos viriam a impossibilitar a sua publicação (as cópias dos editores e as correcções do compositor teriam sido perdidas), pelo que a mesma só viria a ser publicada em 1826, no ano anterior ao da morte do compositor, e numa versão que, segundo reza a história, não o satisfaria particularmente. Beethoven viria ainda a exigir urgentemente aos editores a correcção dos erros existentes, mas seria tarde de mais, pelo que, infelizmente, nenhuma outra versão seria publicada no seu derradeiro ano de vida, nem tão pouco nos 150 anos seguintes.
Chegados aos nossos dias, podemos constatar algumas diferenças entre as várias versões disponíveis, umas baseadas na antiga publicação e outras representadas por estudos mais recentes sobre as intenções originais do compositor, elaboradas após análises cuidadas dos seus "Cadernos de Conversação" e da correspondência dos amigos (existe, aliás, uma carta famosa escrita por Franz Oliva a 10 de Abril de 1820, que diz assim: "Eu esqueci-me de lhe dizer que ontem alguns diletantes abreviaram a sua sinfonia; no terceiro andamento foi omitida quase metade da música."), diferenças essas que poderão ser percebidas de forma notória no terceiro andamento, com a introdução da repetição do primeiro tema (o registo de Kurt Masur é um bom exemplo), dando a este Allegro a estrutura de cinco partes habitual na obra de Beethoven desse período artístico.
Novidades à parte, no fundo, apesar desta obra icónica começar com um momento de inspiração "Cherubiniana", tudo o que se desenvolveria a seguir devemo-lo exclusivamente ao génio de Beethoven, pela criação das linhas melódicas a partir das quatro notas ferozes iniciais no Allegro con brio [I] e a sua utilização sob forma de variação subtil no Andante con moto [II], pelo fugato vigoroso no Allegro [III] que parodia o estilo orquestral do séc. XVIII com a atribuição da mesma linha melódica a violoncelos e contrabaixos (como a comédia de costumes que se adorava representar naquela época), pela passagem ininterrupta ao heroico Allegro [IV] e pela reaparição de sonoridades antigas vindas do além (o fantasma do tema...) antes da recapitulação final, vencidas pela força da luz que irradia dos triunfantes, dentre estes, os cinco novos que só chegariam agora: o flautim, o contrafagote e os três trombones, que de forma brilhante comunicarão pela primeira vez na literatura sinfónica a vitória final sobre a tragédia. Teria sido a primeira, mas seguramente que não seria a última...
...Desde 1843 que entre nós o Código Morse representa a letra "V", como Vitória, pelas sílabas "dit-dit-dit-dah". Á falta de melhor explicação, poder-se-á supor que o espírito artístico do romantismo (o fantasma do tema...) terá decerto baixado no pintor Samuel Morse.
...Desde 1977 que a sonda espacial Voyager 2 viaja para os lugares mais longínquos do universo. Leva consigo um disco de cobre com a gravação desta música para que outros possam escutar um exemplo de humanidade (...à chegada). Uma escolha acertada... seja ela pela crença na Criação da diversidade a partir da Unidade, seja ela pela vontade poética de transformar as trevas em Luz e a derrota em Vitória.    

   
Nuno Oliveira




"Sinfonia nº 5, em dó menor, op. 67"


✨ Extractos que proponho para audição: (nota: ver também publicações nº 3, 45, 62 e 81)
  • New York Philharmonic
  • Kurt Masur
  • Teldec, T2-77313
"o belo": toda a obra (Uma interpretação verdadeiramente poderosa e electrizante, com
                destaque para a sonoridade exuberante da orquestra da Big Apple e o talento
                do mestre Masur. "Tons" suaves nas madeiras, quentes nas cordas e acutilantes
                nos metais, desde o icónico "Tcham, tcham, tcham, tchaaaaam!" inicial até ao
                final de cortar a respiração. Um registo de eleição.), com alguns destaques,
                identificados a seguir;
                [I]: tutti, aos 0:00-2:13 ("o belo" e mais grandioso tema da história da música
                ocidental!); trompas, aos 2:55-2:59 ("o belo" ainda mais acutilante!); oboé,
                aos 4:36-4:51 (Uma pausa para "o belo" lirismo...); tutti, aos 6:28-7:27 (... e o
                esperado drama final ao espírito romântico!) [youtube]
                [II]: cordas e madeiras, aos 0:00-0:55 (Cordas quentes e madeiras suaves.),
                4:02-5:03 (Cordas quentes...) e 5:15-5:57 (...e madeiras suaves.); tutti, aos
                8:40-9:10 (Pronúncio do "fim"...) [youtube]
                [III]: trompa, aos 0:21-0:27 e 3:40-3:45 (Dois alarmes a despertar...[youtube]
                [IV]: tutti (...para dez minutos e trinta e cinco segundos d"o belo" júbilo!) [youtube]






  • Wiener Philharmoniker
  • Simon Rattle
  • EMI, 7243 5 57566 2 6
"o belo": (Uma actuação ao vivo no Musikverein de Viena onde se sentem a frescura e
                expressividade características do maestro inglês. Os instrumentos são modernos,
                mas a inspiração retorna à época da estreia, com contrastes bem marcados,
                vibratos curtos nas cordas e um final de festa e liberdade. Uma interpretação
                a não perder.)
                [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]






  • Chamber Orchestra of Europe
  • Nikolaus Harnoncourt
  • Teldec, 0630-10014-2
"o belo": (A exigência do mestre é grande, mas a resposta do grupo é de que tudo
                parece fácil. Quem sabe, sabe, e Harnoncourt e os músicos europeus
                sabem-no como ninguém. Luminoso e excitante. Simplesmente fabuloso.)
                [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]






  • Orchestre Révolutionnaire et Romantique
  • John Eliot Gardiner
  • Deutsche Grammophon, 445 944-2 AH
"o belo": (Uma interpretação fulgurante, com a elevada rotação e o virtuosismo
                orquestral "comme il faut". Final arrebatador em instrumentos de época
                e sentimentos que reflectem a urgência do nosso tempo. Uma experiência
                estimulante a não perder.)
                [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]






  • Los Angeles Philharmonic Orchestra
  • Carlo Maria Giulini
  • Deutsche Grammophon, 410 028-2 GH
"o belo": (O registo famoso do maestro italiano ao comando da gloriosa orquestra
                norte americana no início dos anos 80. Interpretação arrebatadora e com
                um final majestoso. Uma escolha ímpar e a não perder também.)
                [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]






  • Sinfonieorchester des Norddeutschen Rundfunks Hamburg
  • Günter Wand
  • RCA, RD 60092
"o belo": (Visão clara e directa, sonoridades incisivas e um final excitante sabiamente
                conduzido pelo mestre Günter Wand. Uma interpretação com carácter e uma
                excelente escolha também.)
                [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]






  • Berliner Philharmoniker
  • Herbert von Karajan
  • Deutsche Grammophon, 413 932-2 GH
"o belo": (As sonoridades sumptuosas numa interpretação espontânea, como só o mito
                von Karajan/Berliner Philharmoniker podem oferecer. Uma magnífica opção.)
                [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]






  • The Philadelphia Orchestra
  • Riccardo Muti
  • EMI, CDC 7 47447 2
"o belo": (Como nos ensina a história: um maestro italiano e uma orquestra americana
                só podia dar numa 5ª explosiva. Uma boa escolha, e a ter em conta também.)
                [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]





  
   
✰ Outras sugestões:
  • Leonard Bernstein/Wiener Philharmoniker/Deutsche Grammophon, 431 049-2 GBE (Interpretação apelativa entre a excitação e a introspecção, com um final emocionante registado ao vivo no Muzikverein de Viena no final dos anos 70.), [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]




  • Kurt Masur/Gewandhausorchester Leipzig/Philips, 426 782-2 PH (Sonoridade redonda e interpretação controlada. Uma boa opção para os que preferem a majestosidade à rebeldia.) [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]




  • Carlo Maria Giulini/La Scala Philharmonic Orchestra/Sony, 82876782152 (O bater pausado do coração esclarecido do mestre Giulini, a caminho dos 80 anos de idade. Uma visão para descobrir.) [I] [youtube], [II] [youtube], [III] [youtube], [IV] [youtube]





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Ludwig van Beethoven [Viena, 1807]




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As 5 bandas filarmónicas da União de Bandas de Águeda (UBA)

34º Festival da UBA [Fermentelos, Águeda, 02-10-2022]


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Banda Alvarense (Casal d'Álvaro, n. 1905)

34º Festival da UBA [Fermentelos, Águeda, 02-10-2022]


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Banda Castanheirense (Castanheira do Vouga, n. 1896)

34º Festival da UBA [Fermentelos, Águeda, 02-10-2022]


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Banda Marcial (Fermentelos, n. 1868)

34º Festival da UBA [Fermentelos, Águeda, 02-10-2022]


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Banda Nova (Fermentelos, n. 1921)

34º Festival da UBA [Fermentelos, Águeda, 02-10-2022]


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Orquestra Filarmónica 12 de Abril (Travassô, n. 1925)

34º Festival da UBA [Fermentelos, Águeda, 02-10-2022]


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34º Festival da UBA [Fermentelos, Águeda, 02-10-2022]



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