domingo, 17 de abril de 2022


68. Rutter: Requiem |


Um Requiem pelo Commander of the British Empire Rutter.
Uma Música para o Conforto Benéfico do Espírito de John.






Para o Herlânder.
Do padrinho.

(Um Requiem faz sentido neste dia de Páscoa.
Não é Mozart (o teu preferido), mas a beleza desta música surpreende qualquer um.
Vá lá, surpreende-te.)






Quando penso nas palavras Requiem e finais do séc. XX, o nome que imediatamente me ocorre é o do inglês John Rutter (Londres, 1945), de alguém que para além de compositor agraciado pela coroa britânica com um CBE pelos serviços relevantes à música, em 2007, apresentaria também uma vasta experiência na direcção de agrupamentos corais de elite, como seriam exemplos o Clare College Cambridge, do qual fizera parte como coralista enquanto jovem estudante, ou o Cambridge Singers, fundado pelo próprio em 1981.
Rutter viria a escrever o seu Requiem em 1985, um trabalho que não lhe teria sido encomendado como era habitual acontecer naquela época. Na realidade, a composição deste Requiem seria a melhor forma que John encontrara para lidar com o luto pelo seu pai (falecido no ano anterior), dedicando-lhe a obra com as palavras "in memoriam L.F.R.", ao mesmo tempo que também o ajudaria a suportar os efeitos da encefalomielite miálgica diagnosticada nesse mesmo ano.
Apoiando-se na tradição de mestres como Brahms ou Fauré, Rutter adoptaria por não seguir de forma estrita o conceito da Missa Pro Defunctis estabelecido na liturgia católica, utilizando por sua vez uma selecção pessoal de textos em latim e em língua inglesa, tirados quer da Missa de Requiem (em latim), quer do Livro das Orações Comuns de 1662, e dos Salmos 23 e 130 usados tradicionalmente nas cerimónias fúnebres (em língua inglesa).
Por outro lado, e atendendo ao caracter contemplativo e intimista desta obra em detrimento do sentimento de dor e do dramatismo muitas vezes utilizados neste tipo de música, poderíamos considerar com razoável segurança, que as recordações da participação do jovem coralista da Highgate School na primeira gravação do grandioso War Requiem, dirigido por Benjamin Britten em 1963, teriam tido menor impacto no resultado final do seu Requiem do que as que o maduro compositor tivera em 1984 durante a gravação (aclamada!) do lírico Requiem de Gabriel Fauré para a sua própria etiqueta discográfica, a Collegium Records. Com efeito, em termos de escala e sensibilidade, é bem provável que esta peça deva mais ao francês Fauré do que ao seu conterrâneo Britten, em mais um bom exempo do benefício artístico que a globalização das ideias e dos sentimentos aporta.
Segundo o compositor, as sete partes deste Requiem formariam um arco de meditação sobre temas musicais inspirados na vida e na morte. A primeira [I] e a última [VII] representariam orações em nome de toda a humanidade, a segunda [II] e a sexta [VI] os salmos, a terceira [III] e a quinta [V] as orações pessoais do autor a Cristo e a quarta [IV] a afirmação da gloria divina, como aliás não poderia deixar de ser tratando-se do movimento central e pedra basilar que suportaria toda a arcada sonora, sendo por isso glorificada com os habituais "sinos" das celebrações dominicais em dias de festa.
Rutter escreveria ainda dois tipos de acompanhamento possíveis de utilizar dependendo das circunstâncias artísticas (vulgo budget), um para orquestra de câmara e outro para órgão e seis instrumentos (flauta, oboé, tímpanos, glockenspiel, harpa e violoncelo), sendo que a obra seria estreada pelo próprio compositor a 13 de Outubro de 1985, na Igreja Metodista Norte-americana de Lover's Lane, em Dallas, no Texas, suspeitando-se que aquele local sagrado nunca mais seria o mesmo a partir desse dia, assim como inúmeros outros locais de semelhante calibre espalhados pelas vastas terras do Tio Sam, tal seria a contaminação melódica proveniente de Lover's Lane. 
A consolação que esta música proporciona é evidente, o seu consumo em épocas de maior angústia é aconselhável, e, por isso, o sucesso deste Requiem só poderia ser o que na realidade é: enorme.
Felizmente que assim é, pela qualidade do que se escuta... ou o seu contrário, pelos motivos que muitas vezes existem para o necessitarmos de ouvir.

Nuno Oliveira




"Requiem"


✨ Extractos que proponho para audição:
  • Caroline Ashton, Donna Deam
  • The City of London Sinfonia, The Cambridge Singers
  • John Rutter
  • Collegium, COLCD 103
"o belo": toda a obra (O registo icónico realizado em 1986 por John Rutter que
                nos transmite algo de mágico difícil de explicar... é como se de repente
                estivéssemos de volta à capela da nossa terra numa manhã solarenga de
                Domingo de Páscoa, olhamos para o lado e vemos os nossos que já partiram
                a cantar connosco. Arrepiante e imperdível!), com alguns destaques,
                identificados a seguir;
                I - Requiem aeternam: tutti, aos 0:00-1:18 (Magia...), 1:55-2:55 e 3:51-4:45
                ("o belo" dom da melodia na oração suprema da humanidade.) [youtube]
                II - Out of the deep: violoncelo (Céus escuros e nuvens baixas.) [youtube]
                III - Pie Jesu: soprano e tutti (A familiaridade d"o belo" som...)  [youtube]
                IV - Sanctus: tutti (Santificação da alegria com sinos de festa!) [youtube]
                V - Agnus Dei: tutti (Procissão de mágoa e esperança.) [youtube]
                VI - The Lord is my shepherd: oboé e tutti (Céu limpo e nuvens altas visto
                da estante d"o belo" oboé!) [youtube]
                VII - Lux aeterna: tutti (O suave repicar da "harpa" ao longe, na torre da igreja...);
                oboé e tutti, aos 5:40-6:30 (...e "o belo" final da festa da Ressurreição!) [youtube]




 
  • Elin Manahan Thomas
  • Members of The City of London Sinfonia, Choir of Clare College Cambridge
  • Timothy Brown
  • Naxos, 8.557130
"o belo": (A versão para órgão e seis instrumentos de referência. Vozes de excelência
                e interpretação simplesmente sublime. Uma proposta de eleição a não perder.)
                I [youtube], II [youtube], III [youtube], IV [youtube], V [youtube], VI [youtube],
                VII [youtube]




 
  • Edward Saklatvala, Thomas Harries
  • The City of London Sinfonia, Choir of King's College Cambridge
  • Stephen Cleobury
  • EMI, CDC 5 56605 2
"o belo": (As vozes maravilhosas dos rapazes do King's College, som exuberante e
                "o belo" Pie Jesu, oferecido por um menino, a tocar o divino. Aquisição 
                obrigatória.)
                I [youtube], II [youtube], III [youtube], IV [youtube], V [youtube], VI [youtube],
                VII [youtube]




 
  • Rosa Mannion
  • Bournemouth Sinfonietta, Polyphony
  • Stephen Layton
  • Hyperion, CDA20947
"o belo": (Sonoridade radiante e instrumentistas solistas magníficos numa gravação
                repleta de graciosidade e profundidade. "o belo" Pie Jesu é interpretado de
                forma sublime. A não perder também.)
                I-VII [iTunes]







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John Rutter, CBE [2007]




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"Requiem aeternam ou princípio (do fim...)" [Latada, Coimbra, 1996]





"Lux aeterna ou fim (...nalmente!)" [Rasganço, Coimbra, 2002]



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